"Por mares nunca dantes navegados..."
sexta-feira, maio 28, 2004
 
This is what a 'feminist' writes like
Ia eu no Metro e, numa estação, entram dois rapazes que se sentam nas cadeiras defronte a mim... Tinha-me esquecido do Discman em casa e estava alegremente a ler, quando entre eles o diálogo começa. Não pude deixar de ouvir... Bahhhh!!!

Começaram por falar de um amigo comum que - e aqui trocavam olhares de aprovação, gestos de assentimento e sons de absoluta adulação -,nas suas palavras, "é que a sabia levar [à vida]". Afinal de contas, "aviava gajas" de uma maneira impressionante e não conseguia estar numa relação sem "dar umas voltas por fora". Este "gajo" era portanto o arquétipo do que todo o homem (com "H" pequenino pois, que não merece mais!) luso devia ser.
Finda a conversa sobre o tal amigo e ainda com uma wistful face começaram então a discorrer sobre a vida de outra pessoa, desta feita uma conhecida comum. E foi aqui que comecei a erguer cada vez mais alto o meu mui amado Inimigo Público para esconder não só o olhar de profunda consternação mas também o esgar de raiva. Esta rapariga era então uma grandessíssima puta (Confesso que tive um sério dilema sobre escrever ou não a palavra mas decidi-me pelo sim; afinal de contas, e ainda que este seja um blog family friendly, as criancinhas ouvem todos os dias coisas bem piores e - puritanismos, não obrigada!! Quem se sentir mal que ponha as pernocas para cima e tome uma bebida açucarada!). E era uma grande puta porquê? Ora bem, pelo que pude depreender, era-o porque 'gostava de se divertir', ou seja tinha mais ou menos o mesmo género de comportamento do tipo acima referido, com a benesse (digo eu) de não ter quaisquer relações sérias. Mas não era um tipo e aqui é que estava A Questão.

Não vou dizer que aprovo ou deixo de aprovar o comportamento dela. Confesso que a promiscuidade é uma coisa que me faz confusão - chamem-me antiquada - mas, de qualquer modo, simplesmente não me diz respeito. Já o dele não tenho qualquer problema em reprovar... O conceito de 'pular a cerca' é coisa que acho nojento. Mas nada disto me faz falar aqui agora. O que me faz falar é o conceito de profunda desigualdade entre Homens e Mulheres subjacente aos juízos proferidos pelos dois rapazes.

Os Homens 'sabem levá-la bem'; as Mulheres são putas. Os Homens estão nos cargos de chefia; as Mulheres esgalham muito para lá chegar e, quando os atingem, têm que provar o seu valor todos os dias (ouvindo muitas vezes bocas sobre promoções horizontais). Aos Homens, quando lhes dão prémios, falam do que fizeram pelo bem do Mundo; quando o fazem às Mulheres não se esquecem de mencionar que, apesar de tudo, conseguiram aliar o trabalho executado às tarefas inerentes de boa esposa e mãe - como se não merecessem o raio do prémio se não provassem ser, afinal, mulherzinhas; isto porque gente não casada ou sem filhos ou não-a-esposa-adorada-e-amada-perfeita não é digna de reconhecimento! Mulheres que só agora podem manter uma bolsa de doutoramento se engravidarem. Mulheres a quem só agora foi reconhecido o direito de voto. Mulheres a quem só agora foram reconhecidos os mesmos direitos que os dos Homens...
Todos os dias, por esse Mundo, há miúdas a serem mutiladas. Crianças-mulheres a serem queimadas com ácido porque cozinharam mal o jantar. Raparigas a serem mortas pelos próprios pais pela vergonha que trouxeram à família - não só conseguiram ser raptadas como permitiram mesmo que as violassem... Mulheres que estão presas há décadas para a sua própria protecção, escondidas de vinganças e limpezas da honra. Mulheres que são obrigadas a ver o Sol por detrás de um tecido e a quem são negados cuidados médicos porque não podem ser tocadas por Homens e às Mulheres não as deixam ser médicas. Meninas que não podem estudar porque são, justamente, meninas. Mulheres que sofrem porque, simplesmente, são Mulheres...

Muitas vezes acusam-me de ser Feminista.
Não concordo, por princípio, com extremismos. Não quero substituir os Homens por Mulheres. Não acho que as Mulheres devam queimar soutiens ou negar a sua feminilidade. Não acredito que as Mulheres sejam superiores... em nada. Mas se estar consciente do que se passa por aí e gritar todos os dias que está mal e que tem que ser mudado, se achar que a igualdade não passa de um conceito teórico ainda mas que pode ser uma realidade, se exigir que todas as meninas possam acordar um dia para o mesmo mundo de possibilidades que saúda os meninos quando estes abrem os olhos; bem, se achar isto tudo é ser Feminista, então não me importo nada de mandar fazer t-shirts... Eu cá acho que é só ser uma pessoa decente e ter dois dedos de testa mas ok...

*beijos*



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